Arca do afro-funk
A arca do afro-funk acaba de desvendar mais duas pepitas sonoras. O efeito do fenômeno do funk nos anos 70 – com o sucesso de artistas como James Brown, Kool and Gang, Aretha Franklin, Curtis Mayfield e outros – é algo global e fomentou uma cena própria no continente africano. A combinação da mensagem do orgulho negro com um ritmo feito para dançar e protestar, reverberou em alto e bom som em países como Nigéria, Benin, Gana, Congo, Etiópia, Costa do Marfim, Quênia, Senegal, entre muitos outros. O histórico de guerras civis e o isolamento no contexto geopolítico, no entanto, abafou essa produção para o resto do mundo por décadas e um crescente movimento de redescoberta traz à tona verdadeira joias perdidas da discografia africana.
Nos últimos dias, essa escavação musical trouxe à tona mais duas preciosidades reluzentes: Ayaléw Mesfin (da Etiópia) e Orchestre Abass (do Togo). Um vídeo produzido pelo site Noisey registra o encontro do produtor Madlib com o músico etíope. Mesfin é autor de um hit do chamado ethio-jazz, “Hasabe”, e essa faixa especificamente chamou atenção do norte-americano e também do inglês Egon (fundador do selo musical Now Again Records). A dupla resolveu procurar o músico, o encontraram na cidade de Denver (Estados Unidos) e o desfecho do mini-documentário é pura emoção. Mesfin era um artista popular na Etiópia, porém a ditadura do país entre 1974 e 1987 o levou à cadeia e sua música foi banida. “Se você gosta da minha música, então você deve estudar o que eu sampleio”, diz Madlib no filme.
O legado da Orchestre Abass também esteve ameaçado pela instabilidade política em Gana, no final dos anos 80. A multinacional Polygram mantinha uma indústria na capital do país, Accra, porém teve de encerrar as atividades por lá devido ao clima hostil nas ruas da cidade e aos toques de recolher que oprimiam a população. Em 2008, o alemão Samy Ben Redjeb (dono do selo Analog Africa, que tem um catálogo extenso de reedições e coletâneas de afro-funk) visitou o depósito da gravadora e encontrou fitas em ótimo estado de conservação com material inédito da banda do Togo. Este material é agora reunido no LP “De Bassari Togo”, com seis faixas, que já tem pré-venda no ar e tiragem limitada de 2 mil cópias em vinil.
Radiola Urbana recomenda fortemente o filme com Ayaléw Mesfin e o disco da Orchestre Abass. Tratam-se de mais dois capítulos de uma história musical que por pouco não se perdeu.