Campos do samba
Nenhum lugar é assim tão longe. A geografia musicada de Rodrigo Campos agora faz o movimento para dentro dele mesmo, um retorno à sua origem, uma visita ao samba que o formou como artista. Seu quarto disco, “9 Sambas”, será lançado nessa sexta-feira 3 de agosto nas plataformas digitais pela gravadora YB Music e a Radiola Urbana divulga com exclusividade a capa e uma música inédita do trabalho. “Bloco das Três da Tarde” é uma dessas joias tão comuns na obra do paulistano, um nível de composição muito raro – letra, melodia e arranjo se emaranham com naturalidade, sofisticação e inspiração, uma beleza.
É interessante o caminho que o fez dar essa volta. Seu primeiro disco, “São Mateus Não é um Lugar Assim Tão Longe” (2009) é samba na veia com um conteúdo lírico autobiográfico: as letras projetam memórias reais, personagens que o artista de fato conheceu (chamados pelos seus nomes verdadeiros) e situações que ele viu ou viveu no bairro da zona leste de São Paulo onde cresceu. Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência. É tudo verdade. Já “Bahia Fantástica” (2012) é um passeio pelo desconhecido: da influência da soul music recém-incorporada por ele ao território do estado nordestino (onde ele, até então, pouco tinha pisado). É tudo ficção. “Conversas com Toshiro” (2015) é abstração completa: um delírio inspirado no oriente, no Japão, no cinema e literatura asiáticos. É tudo surrealismo.
“9 Sambas” devolve Rodrigo Campos ao seu lugar primeiro. O samba, porém, já não é um veículo para seu documentário, para o álbum de fotos, para as anotações do diário. Se a música faz um retorno para a essência de “São Mateus…”, as letras parecem ir adiante do ponto que chegou em “Toshiro” – a imaginação além, um infinito sem horizonte.
“Na busca por uma voz que pudesse ser um pouco minha, mas que fosse também comum ao samba, escolhi falar de uma forma inerente ao gênero, pegando emprestado esse olhar contemplativo, mas também direto na simplicidade de sua filosofia”, escreve o músico em um texto de apresentação do trabalho. “Não que se possa realizar, de fato, a irreverência metafísica dos grandes sambistas, seria mais procurar por ela. Dito isso, à maneira deles, destilei alguns pensamentos sobre o absurdo, o jogo da vida, o homem, a clareza, a dor, as bandeiras, a mulher e o envelhecimento. Também imagino, nesses nove assuntos, nove biologias do samba, ou nove arquétipos do samba, como se fosse o samba uma pedra partida em nove pedaços”.
Rodrigo Campos é um dos grandes da música brasileira de hoje e sempre.